quarta-feira, 13 de fevereiro de 2008

CINCO EUROS PELA MINHA LIBERDADE E PALAVRAS MÁGICAS

Nessa tarde nem queria acreditar no que apareceu junto à caixa de vidro! E pelo jeito não fui o único!
Gerou-se a confusão, começámos todos aos encontrões e a falar ao mesmo tempo!
Mesmo à minha frente comecei por ver umas pernas compridas, alguém que se agachava, à mistura com sons abafados e piegas. Que era aquilo?
Não pensei duas vezes, atirei com a timidez para trás das costas, formei o salto, dando por mim bem junto ao vidro e atrevido levantei a pata com os dedos bem abertos. Sentia os empurrões, os protestos dos outros, mas já não houve nada que me tirasse dali!
O meu coração galopou feito maluco, quando do outro lado vi também uma mão erguida que se baixava em pancadinhas, abria de quando em quando os dedos e observei uns olhos postos em mim.
Senti um aperto! Sim, porque nós gatos também nos comovemos!
Alguém se aproveitou da minha contemplação e quando menos esperava fui retirado da caixa de vidro e encerrado noutra mais escura. Engoli o mau génio e deixei-me ficar na expectativa enquanto alguém me transportava e falava em tom animado.
Ao fim duns minutos, com algumas sacudidelas que heroicamente aguentei, voltei a ver as pernas compridas e ouvi as palavras mágicas:
- Pronto, pequenino, já estás em casa! Benvindo sejas!

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2008

CERTA NOITE TIVE UMA IDEIA

Por diversas vezes vi a minha dona mais nova sentada à mesa, mas não a comer. Com um ar muito sério ía mexendo os dedos, ouviam-se estalinhos e ela olhava em frente de quando em quando. Para espanto meu ria que nem uma perdida!
Como bom gato que se preza, sou curioso e comecei a ouvir as conversas, até porque me orgulho de rapidamente aprender a entender os humanos.
Vou-vos contar o que descobri - a minha dona mais nova escreve coisas sobre o que vê, o que ouve, o que lê, o que sente!
Afinal não sou só eu o coscuvilheiro!
Até que certa noite, não me perguntem quando tive uma ideia. Ela que também já me vai tentando entender, sentiu-me aproximar daquela mesa onde ela tanto gosta de estar e olhou-me.
Alternando o descaro e a timidez pedi-lhe que escrevesse as minhas histórias. Não foi preciso ronronar muito, pois vi na cara dela a aceitação ao desafio. Antes que ela se arrependesse comecei suavemente a ditar. Chamei à primeira...

A CAIXA DE VIDRO


Tudo apontava para ser mais um dia igual aos outros dentro da caixa de vidro.
Estava quentinho, tinha comida, tinha bebida, mas por mais que puxasse pela cabeça, nada!
Duma coisa eu tinha a certeza. Tive um Pai e uma Mãe.Contudo por mais esforços que fizesse não me conseguia lembrar da cara deles.
À minha volta sentia a tremenda agitação provocada por uma pequena multidão igual a mim. Será que pensavam o mesmo que eu? Ninguém ousou trocar confidências, pois estavamos todos encerrados na mesma caixa de vidro , muito possivelmente entregues à mesma ausência de recordações e atormentados por idênticas interrogações.